sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Entrevista com Duda Alfena


Eduarda Johanna Alfena ou simplesmente Duda é uma menina aficionada pela música. Toca piano e violino desde 18 anos de idade. Atualmente tem 21 anos. Gosta muito de história. Ela também é dona de uma página no Facebook chamada "Duda, uma menina diferente", em que ela narra suas aventuras e decepções sobre ser uma menina trans com Asperger, uma síndrome do espectro autista.
Na entrevista a seguir, a pedido de Duda, mantive os substantivos em letras maiúsculas. Conheçam de perto essa garota extraordinária. 


Jaqueline Furacão -  Você poderia  falar um pouco sobre a síndrome de Asperger para o público leigo?

Duda - Com certeza, estou aqui pra esclarecer ao Máximo. Autismo, é um amplo Espectro de Condições, não falo mais ‘Doença’.
Asperger é a Condição mais leve de todo o Espectro. Normalmente pessoas Aspergers (Aspie, pra quem não fala Alemão) tem QI elevado. Nossos interesses são extremamente reclusos. Gostamos das mesmas coisas, ouvimos as mesmas Músicas, comemos as mesmas coisas. Temos praticamente a mesma Rotina. Hoje em Dia eu já ouço outros estilos, mas, continuo muito reclusa com Comida. Nos Dias que passei na UNICAMP, entre 27 e 29 de Junho do Ano passado, tive oportunidade de almoçar no ‘’Bandejão’’. Só comi Arroz, Rs. Aos poucos vou experimentando mais coisas, mas, são pequenos avanços.
Além de tudo isso, não olhamos nos Olhos. Fora, que somos muito Ansiosxs, isso acaba nos causando certos problemas na Dicção.
Porém, essa reclusão em interesses, nos torna excelentes Profissionais. Pois, só fazemos, falamos, lemos, aquilo que gostamos. Aspergers famosxs posso citar: Albert Einstein, Lionel Messi, Daryl Hannah, e Hans Asperger (o Médico Psiquiatra-Pediatra que descobriu a Síndrome de Asperger).

Jaqueline Furacão -  Duda, por vc ser trans e Asperger o estado exerce um controle em dobro sobre o seu corpo. Conte um pouco pra gente sobre essas "aventuras" médicas.

Duda - Bom, não posso citar Nomes. As Pessoas Cis, na forma dos Protocolos Médicos, exercem total controle sobre nossos Corpos e Identidades. Cabe a elas dizer se somos ou não Trans*. Fora o fato que elas excluem Pessoas desses atendimentos.
Para poder ingressar em algum Ambulatório, tem que fazer uma Triagem. Responder perguntas sobre a sua Vida. Se lá, elxs acharem que você ‘’pode’’ ser Trans*, você ingressa.
Pessoas que tenham alguma ‘’Doença Mental’’ não podem ingressar. No meu caso, a desculpa é que a Transexualidade seria uma Fuga para o Autismo. O que acho que o chefe do Ambulatório onde sou atendida está tentando fazer, creio, ser provar que exercer a Identidade e adequar o Corpo traz melhorias ao Autismo, o que de fato acontece. Eu tenho Disforia Genital, necessitando da Cirurgia de Transgenitalização.  

Jaqueline Furacão -  Suas duas paixões são a história e a música. Vc pensa em seguir carreira em alguma delas? Quais são suas dificuldades para aceder ao ensino superior?

Duda - Com toda certeza. Quero ser Historiadora e Regente. Aliás, faço questão que minha Pós-Graduação seja em Musicologia: o Estudo Histórico, Filosófico e Sócio Antropológico da Música Erudita. Conciliar como as Mudanças Histórico políticas interferiram na Vida e Obra dos Grandes Compositores, é simplesmente excitante para mim.
Eu pretendo ingressar esse Ano em algum Curso, para prestar o Vestibular. Eu tenho extrema dificuldade com Exatas. Por causa do Asperger, aquilo que não nos interessamos, simplesmente passa batido. A maior dificuldade será com a Matemática, Física e Química.

Jaqueline Furacão -   Na sua página, "Duda, uma menina diferente", vc escreve uma série de reflexões muito interessantes. O processo de escrita é catártico pra vc? Fale sobre sua relação com a escrita.

Duda - É emocionante sim. Fiz uma Página que não deu certo. O que me deixou muito frustrada. Foi no início de Junho do Ano passado. Em Julho, chegou a data do meu Aniversário de Transição, o Dia em que me assumi Trans*. Uma grande Amiga, que fui visitar em Campinas, fez um Texto em homenagem à esse Dia. Isso me deixou com vontade de falar mais de mim. Eu abri a Página atual, e o meu Primeiro Texto teve 1700 visualizações. O que me deixou com muito Gás.
A Página tem me ajudado a me descobrir, pois, para fazer os Textos, tenho que mergulhar em memórias nem sempre alegres. O que me faz lembrar e contestar como eu me senti. Fora que me passa a impressão de, nem que seja um pouco, estar esclarecendo as coisas. Fora o fato de ter conhecido Gente tão legal através dela.
Nunca tive uma grande Relação com a Escrita. Nunca fui de Escrever. A Página me surpreendeu nisso. Essa minha Amiga revisa os Textos pra mim. E eu sinto que a minha Escrita melhorou muito depois desses Textos. Uma Pessoa que revisa Redações, para o Processo seletivo de uma Empresa, diz que eu venceria muito fácil 90% das Redações. Muitxs elogiam que escrevo com Sinceridade e Empatia. Quero escrever muitos Livros de Música e História.

Jaqueline Furacão -  Por que o dia da visibilidade trans é importante?

Duda - Não só o Dia, mas a Semana, o Mês, o Ano e o Século. Visibilidade é o que nos falta. A População Trans* é oprimida inclusive por outras partes da Própria Sigla LGBT. Temos que quebrar essa Transfobia nossa de cada Dia. Temos que nos fazer ouvir e lutar pelos nossos Direitos. Direitos que não caíram do Céu, como nada cai. Temos que juntxs, fazer com que exista a nossa Visibilidade. Fazer com que sejamos ouvidxs, vistxs e respeitadxs. Façamos cada Dia um Dia da Visibilidade Trans*, assim como a Visibilidade de todas as Classes oprimidas. 

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