sábado, 11 de outubro de 2014

Géia Borghi, uma estrela que cruzou meu destino

O cenário drag de Campinas pra mim é um lugar bastante novo. Apesar de eu já ser conhecida de um pequeno público, ainda não sou muito conhecida pelas demais artistas drags que colorem as noites e boates da cidade, tampouco sou conhecida pelo grande público que as segue.
Recentemente tenho tentado me inserir mais. Tenho participado de concursos na cidade e tentado me entrosar com algumas meninas. 
Pois.... foi em um desses concursos que conheci a Geia.
Ela fazia parte do jurado daquela noite. Lá do camarim, ouvi o nome dos presentes. Quando citaram que a Geia ali estava, fiquei emocionada em me apresentar pra ela, a referência das referências.
Cheguei na boate Subway bastante cansada, era meu terceiro show da noite. Tinha saído de casa às 2h30, depois de uma passagem meteórica como performer e apresentadora da festa do Babado, na Unicamp. A previsão para o início do concurso era 3h. Cheguei toda esbaforida no camarim faltando 5 minutos para tudo começar.
Entrei, fiz meu número. Era uma música meio dramática, melodiosa em espanhol. Senti que não havia alcançado a plateia. Acho que as pessoas esperavam uma música mais alegre ou uma maior empolgação da minha parte. Rompi as expectativas. Rompi também por um pequeno detalhe, o meu tamanho: não se espera que uma drag seja minúscula. Optei também por um figurino mais limpo: sem brilhos e nem pedras. Queria chamar a atenção para o glamour da simplicidade. Embora eu parecesse esplêndida pra mim, aparentasse latinidade, quase ninguém entendeu a minha proposta. Quebrei o clima completamente.
Fiquei bastante chateada por não ter dado conta do recado. Fui embora de ônibus, pensativa, sozinha, chateada. Dois dias depois, no meio do desânimo, a Geia me encontrou no site feices e me chamou para conversar. Ela disse que eu havia chamado a atenção dela. Fiquei bastante lisonjeada e o desânimo passou na hora. Daí, na lata, ela disse que eu deveria fazer Edith Piaf. Geia achava que Edith combinava mais com o meu corpo, por causa da nossa pequena estatura. Falou que me faltava direção e uma escolha mais adequada de repertório.
Ela também me deu conselhos: "Não seja mais uma drag comum. Seja vc, autêntica e com estilo próprio."



Tudo isso, eu gostei demais. Fiquei muito feliz, porque via nela uma mãe que não tive. E justo ela que fazia uma linha que me agrada demais. A nossa amizade estava apenas nascendo.
Num meio em que você leva alfinetada o tempo todo, num meio em que qualquer detalhe da sua maquiagem ou figurino é ridicularizado, num meio em que o corporativismo te impede o acesso aos palcos, num meio em que há muita rivalidade, eu via na Geia uma grande pessoa acolhedora. Ela não tinha nada a ganhar comigo, uma simples novata. Mas ela foi demais, me acolheu e me recebeu com conselhos preciosos. Falou o que eu tinha que escutar, fez sua crítica, deu suas sugestões. Passei a admirá-la ainda mais.
Isso tudo faz menos de 15 dias. Com seus quase 15 dias, o pequeno broto da nossa amizade foi dilacerado pelo ódio transfóbico de criminosos.



Em sua homenagem, dedico a canção de Piaf que havia gravado dias depois de seus conselhos.
Link da música: aqui


Querida Geia, aposto que você também não se arrepende de nada. Valeu a pena te encontrar, ainda que fosse por tão pouco tempo. Obrigado por ter cruzado meu destino.


P.S. > Pessoal, segunda-feira (13/10) é dia de luta. Estão todos convocados a comparecerem no ato contra esse brutal assassinato. A concentração vai ser no largo do Rosário, a partir das 17h. 

Link do evento: aqui



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