Em face ao feminino, já é bastante sabido que o
masculino tem seu lugar de garantido prestígio. O feminino, em várias ocasiões,
é rechaçado em nossa cultura. Não é à toa que encontramos uma tipologia em que
se pode enquadrar crimes como feminicídio, ou até mesmo, sejamos obrigados a
criar leis que protegem mulheres cis, como é o caso da famosa Lei Maria da
Penha. No fundo, trata-se da velha misoginia exercida em seus diferentes graus
e que não encontra equivalente para o masculino, pelo menos não na mesma
proporção e tampouco pelo acúmulo de anos de tradição.
A misoginia no meio LGBT é algo bastante
recorrente. A começar pelos próprios supostos protagonistas da comunidade LGBT,
os G. Sabemos que os gays, se quiserem ser respeitados ou até mesmo sair da sua
invisibilidade afetiva, são quase que obrigados a performar um comportamento
“másculo”. Gays afeminados (ou “afetados” se preferirem) não só são alvos mais
frequentes de crimes homofóbicos, como são bastante desprezados pela parcela
máscula da comunidade, e às vezes pela não tão máscula também.
Mulheres cisgêneras comumente também são alvo de
comentários misóginos por parte dos gays. Ou
vai me dizer que nunca ouviu um
amigo gay dizer que tem nojo do corpo de mulher cis? Muito embora seu amigo
tenha tentado se esquivar com o velho argumento de que se trata de “gosto” e
não de misoginia.
Mulheres trans, principalmente as travestis, sofrem
bastante discriminação dentro do grupo LGBT. Talvez por, além de serem
mulheres, elas rompam com as expectativas da compulsoriedade cisgênera.
No meio disso tudo, estão as Drag Queens. E aqui
existem dois movimentos que se contradizem: ao mesmo tempo em que as drags são
bem aceitas e bem respeitadas na noite por seu público, elas, geralmente, são
também alvo da misoginia. Tem muito mocinho que não namoraria uma drag,
simplesmente pelo fato de ela ser uma drag.
Fico tentando entender porque drags são
personalidades na noite e as respostas que consigo delinear são:
i)
Drags glamourizam o feminino. E o glamour é tido
como algo positivo para os protagonistas gays. É muito tenso pensar que esse
fator ultra mercantilista é uma das engrenagens para o sucesso drag.
ii)
RuPaul conseguiu conquistar outra grande
protagonista do mercado: a classe média. RuPaul conseguiu expandir o nicho drag
para além do gueto e das boates e entrou nos lares da classe média.
iii)
A drag é exotificada. Por ter um visual exótico
e por ter um mistério de transformação, a drag não passa despercebida.
Seguramente,
haverá muitos outros fatores que explicam o relativo prestígio de uma drag. Se
o interseccionarmos a outros quesitos, como o de classe, escolaridade, raça,
etc encontraremos insights bastante profícuos.
Agora,
quanto à misoginia simbólica a que é submetida, sabemos de cor e salteado que o
machismo nosso de cada dia é o grande responsável pela padronização, castração
e recalcamento das liberdades dos corpos e dos gêneros.
Fotos by Erik Nardini |
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