O cenário
drag de Campinas pra mim é um lugar bastante novo. Apesar de eu já ser
conhecida de um pequeno público, ainda não sou muito conhecida pelas demais
artistas drags que colorem as noites e boates da cidade, tampouco sou conhecida
pelo grande público que as segue.
Recentemente
tenho tentado me inserir mais. Tenho participado de concursos na cidade e
tentado me entrosar com algumas meninas.
Pois.... foi em um desses concursos que conheci a Geia.
Pois.... foi em um desses concursos que conheci a Geia.
Ela
fazia parte do jurado daquela noite. Lá do camarim, ouvi o nome dos presentes.
Quando citaram que a Geia ali estava, fiquei emocionada em me apresentar
pra ela, a referência das referências.
Cheguei
na boate Subway bastante cansada, era meu terceiro show da noite. Tinha saído
de casa às 2h30, depois de uma passagem meteórica como performer e apresentadora
da festa do Babado, na Unicamp. A previsão para o início do concurso era 3h. Cheguei toda
esbaforida no camarim faltando 5 minutos para tudo começar.
Entrei,
fiz meu número. Era uma música meio dramática, melodiosa em espanhol. Senti que
não havia alcançado a plateia. Acho que as pessoas esperavam uma música mais
alegre ou uma maior empolgação da minha parte. Rompi as expectativas. Rompi
também por um pequeno detalhe, o meu tamanho: não se espera que uma drag seja
minúscula. Optei também por um figurino mais limpo: sem brilhos e nem pedras.
Queria chamar a atenção para o glamour da simplicidade. Embora eu parecesse esplêndida
pra mim, aparentasse latinidade, quase ninguém entendeu a minha proposta. Quebrei
o clima completamente.
Fiquei
bastante chateada por não ter dado conta do recado. Fui embora de ônibus,
pensativa, sozinha, chateada. Dois dias depois, no meio do desânimo, a Geia me
encontrou no site feices e me chamou para conversar. Ela disse que eu havia
chamado a atenção dela. Fiquei bastante lisonjeada e o desânimo passou na hora.
Daí, na lata, ela disse que eu deveria fazer Edith Piaf. Geia achava que Edith
combinava mais com o meu corpo, por causa da nossa pequena estatura. Falou que
me faltava direção e uma escolha mais adequada de repertório.
Ela também me deu conselhos: "Não
seja mais uma drag comum. Seja vc, autêntica e com estilo próprio."
Tudo
isso, eu gostei demais. Fiquei muito feliz, porque via nela uma mãe que não
tive. E justo ela que fazia uma linha que me agrada demais. A nossa amizade
estava apenas nascendo.
Num
meio em que você leva alfinetada o tempo todo, num meio em que qualquer detalhe
da sua maquiagem ou figurino é ridicularizado, num meio em que o corporativismo
te impede o acesso aos palcos, num meio em que há muita rivalidade, eu via na
Geia uma grande pessoa acolhedora. Ela não tinha nada a ganhar comigo, uma
simples novata. Mas ela foi demais, me acolheu e me recebeu com conselhos
preciosos. Falou o que eu tinha que escutar, fez sua crítica, deu suas
sugestões. Passei a admirá-la ainda mais.
Isso
tudo faz menos de 15 dias. Com seus quase 15 dias, o pequeno broto da nossa
amizade foi dilacerado pelo ódio transfóbico de criminosos.
Em
sua homenagem, dedico a canção de Piaf que havia gravado dias depois de seus
conselhos.
Link da música: aqui
Link da música: aqui
Querida
Geia, aposto que você também não se arrepende de nada. Valeu a pena te
encontrar, ainda que fosse por tão pouco tempo. Obrigado por ter cruzado meu
destino.
P.S.
> Pessoal, segunda-feira (13/10) é dia de luta. Estão todos convocados a
comparecerem no ato contra esse brutal assassinato. A concentração vai ser no
largo do Rosário, a partir das 17h.
Link do evento: aqui
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